sexta-feira, 6 de junho de 2014

Mocidade


No ano de 1924, eu ainda lecionava e andava a cavalo pelas estradas arenosas, cheias de curva e barrancos, que me levavam da cidade para a escola.
O cheiro bom que vinha do capim e das plantas da beira da estrada, me fazia esquecer das canseiras das idas e vindas do meu ofício de professora. Ganhava pouco, mas o suficiente para manter o meu dia a dia de moça vaidosa que gostava de andar conforme o seu gosto. Nunca fui de acompanhar a moda exagerada do tempo, não gastava comigo sozinha, tinha também irmãos e parentes para ajudar. O salário era muito pouco, mas dava para repartir as migalhas. No aniversário de meus pais, sempre arrumava um dinheirinho para um presente.

Gostava de trabalhar e o meu sacrifício era saber que em casa ficava minha mãe com meus irmãos sem empregada, muitas vezes, tendo que fazer o serviço caseiro, que não era pouco. Ela costumava arrumar diaristas para o serviço mais pesado, que era o de lavar escadas, varrer o quintal, limpar o galinheiro e lavar roupa caseira, pois as mais pesadas iam para a lavanderia e minha mãe fazia gosto dela mesma passá-las a ferro. Daí então, chamava a Isaura que quebrava o galho levando o filho, Cid, que era meninote de seus sete anos, e ajudava a mãe no serviço caseiro, e fazia compras para minha mãe. Meus irmãos ainda pequenos e primos, Bráz, Wilson, Cida, também entravam na folia da brincadeira de carregar água nos baldes e lavarem com escova as escadas da casa da Rua Tiradentes, onde moramos mais de dez anos. Eu, sempre que podia, comandava a limpeza, ajudando também na esfregação do assoalho.

Agora, passados cinquenta anos ou mais, talvez sessenta e tanto, volto a recordar o meu trabalho caseiro e também saindo três ou mais vezes por semana para a ir até a Hortência, que costurava para muitas freguesas e pedia minha ajuda no bordado ou para riscar os trabalhos...

Hortencia, como já citei em outra Crônica de Saudade, era para mim e, para seus conhecidos, uma verdadeira heroína. O marido era doente, nem sempre podia trabalhar e, assim, ela garantia com seu trabalho de costureira, aliás, uma costureira que dava gosto às freguesas. Admirava seu modo de lidar com as pessoas, sempre com paciência e alegria. Acompanhei-a desde que a conheci em 1914 ou 1915, quando fomos vizinhas na rua José Bonifácio. Teve uma filha, a Ciloca e, mais tarde, a Maria de Lourdes. Anos depois é que teve mais dois, um deles falecido muito pequeno ainda.
Família antiga, gente de raça, os Freire e Assis. Ela casou-se com Ariovaldo Campos, também de família tradicional em Serra Negra; dona Francisca de Campos, sua mãe, seus irmãos Joaquim e Adeina Campos. Senhor Ariovaldo trabalhou como estafeta (mensageiro) no correio local e também num cartório. Foi professor de violino de muita competência e respeito.

Essa gente deve viver na lembrança dos serranos sempre, para perpetuar nos seus descendentes o seu nome.

Nenhum comentário:

Postar um comentário