segunda-feira, 29 de junho de 2015

Dez Marias

por Maria Zélia – junho de 2015

Éramos uma família grande. Atualmente,  ninguém sabe o que é isso! Mamãe teve 15 filhos, cinco homens e dez mulheres, quando penso nem mesmo acredito nessa tamanha coragem de meus pais.


 

Boas lembranças tenho com as Dez Marias.

A primeira, Maria Aparecida ou Mariinha, sempre alegre com a vida e muito trabalhadeira. Pela necessidade começou cedo para ajudar a família. Era boa companhia para tudo. Enquanto solteira, nós passeávamos juntas, íamos dançar, ao cinema, e ao teatro. Ela teve três filhos e foi morar na cidade de Santos e, depois, no exterior, mais precisamente no Texas. Eu a chamava de minha irmã texana. Devo confessar que sempre teve minha admiração, talvez por ser ela a mais velha, meu exemplo.

A segunda, Maria Therezinha. Muito meiga e responsável com tudo e com todos, sofria pelas pessoas, gostava de ajudar as irmãs, era uma das mais estudiosas. Foi funcionária da Secretaria da Educação e, depois do trabalho, quase todo dia, pegava mamãe e iam as duas para o cinema, que tinha acabado de inaugurar perto de casa, o Cine São José.

Maria Inês, a terceira, era perfeccionista em tudo, também estudiosa mas casou logo, teve duas filhas, se tornou uma dona de casa exemplar e uma mãe dedicada. As filhas eram sempre as mais bem arrumadas, dava gosto de vê-las.

Eu, Maria Zélia, a quarta, porém a sétima filha, o número da perfeição! Tenho o nome da minha avó paterna. Me formei professora e comecei como substituta efetiva na escola pública. Naquele tempo, no Estado, contavam-se pontos para poder ingressar no magistério. Como professora foram 35 anos dando muito beliscão! Tive três filhos, duas meninas e um menino.

Segredo, ninguém sabe disso! Quando eu tinha 14 anos, li no jornal que teria um teste de balé, para a São Paulo Ballet, selecionado pela bailarina russa Maria Olenewa, que queria uma menina crua, sem base, sem treino, só aptidão e gosto pela dança. Foi na Escola Carlos Gomes de Música, no Largo do Carmo. E, lá fui eu… sozinha… acreditem se quiser, fiquei com o segundo lugar! Mas, só seria uma a escolhida! Carta marcada? Sei lá, enfim, saí frustrada!

Maria Angela, também tem o nome da nossa avó, só que a materna. Era a mais alta e a mais elegante das irmãs. Também muito trabalhadeira, começou cedo. Foi funcionária da judiciária onde se aposentou.

Maria da Glória, a irmã mais alegre, bem humorada, estávamos sempre rindo ao lado dela. Gostava de dançar, cantar e tinha dom para ajudar as pessoas. Uma cuidadora, era muito querida por todos. Trabalhou na Secretaria da Educação, casou e teve um único filho. Lembro da Glória participando de um festival de dança, no estilo rock anos 60, com seu par Francarlos Reis,  e ganhando o prêmio da noite, no Clube Cultura, nosso preferido para os bailes. Não é um orgulho? Foi lindo, parecia cena de filme!

Ela e Maria Angela eram muito unidas, estavam sempre juntas em todas as ocasiões. Uma aprontava e a outra levava a fama… coisas de irmãos!

Já perdi as contas…

Ah, a sétima, Maria do Rosário ou, simplesmente, Zaio. Na minha opinião, a mais bonita por ser delicada, uma bonequinha de porcelana… gostava muito de dançar, era um ótima bailarina, encantava a todos com seu dom. Seria a bailarina da minha caixinha de música! Lembro que ela trabalhou na secretaria do, na época, famoso Colégio Culto à Ciência, depois casou-se e dedicou sua vida à família, tendo duas meninas.

Maria Izabel, a Bel, alegre, também bonita, era mais do trabalho do que do estudo. Começou na Associação dos Funcionários Públicos e, depois, foi para a Secretaria da Educação, ambos em São Paulo, vindo aposentar-se na Delegacia Regional de Ensino, em Campinas.

Zaio e Bel, ainda pequenas, foram morar em São Paulo com nossa Tia Lourdes, logo que papai faleceu, ficando por lá, até os 15 anos quando pediram para voltar para casa. Lá estudaram em ótimos colégios, como Caetano de Campos e sei que foram muito bem tratadas, diria até mimadas. Quando vinham nos visitar, sempre vestidas com os melhores vestidos, era de nos dar inveja. Qualquer uma queria ir para a capital! Mas ficar longe de mamãe era ruim… só íamos passar férias que, para mim, já era o bastante!

A penúltima, Maria do Carmo, a Carminha. Foi a primeira irmã campineira, uma criança linda, loirinha, loirinha. Eu e a Inês gostávamos de arrumá-la, era nossa boneca, num desses dias de “look perfeito”, chegamos até levá-la num fotógrafo profissional para registrar o momento, de tão linda que a deixamos! Sempre foi ótima estudante, muito inteligente, só me lembro de um episódio engraçado em que perdeu o bonde, mas isso fica pra outra hora… ela se formou professora na Escola Normal, uma das melhoras escolas na época, mas não quis seguir carreira de professora, fez faculdade de Direito, se formando Advogada.

E, finalmente, Maria de Lourdes, a Lourdinha, ou melhor, a Tutti, a queridinha da vovó Zélia! A caçula, a raspa de tacho, como a chamávamos. Nasceu cinco meses depois do falecimento de papai. Acho que isso explica o porque de ser tão chorona… acabou adotando o irmão mais velho, Xyko, como pai. Quando na escola, decorou toda a cartilha… bem peculiar! Casou-se e teve cinco filhos, com o único caso de gêmeos na família.

Dizer que todas eram bonitas, alegres e estudiosas parece redundância, mas todas eram lindas, alegres e, quase todas estudiosas. Como tinha biblioteca em casa, quem foi esperta, aproveitou disso, outras, bem, fizeram sua escolhas.

Outra boa lembrança é a lista da Mariinha e da Inês, escrevendo de A até quase Z o nome dos já namorados… só eu mesmo que fui a mais bobinha nessa área!

Pois bem, esta é a história de minha família, grande, bonita e alegre, que minha mãe, com muita coragem e Fé em Deus, soube educar para a vida.


quinta-feira, 25 de junho de 2015

Histórias da minha avó – A Hora das Almas

Maria Zélia Siqueira – agosto de 2009

Minha avó Ângela gostava de contar histórias para os netos todas as noites. Esse era um momento mais esperado por nós, que ficávamos ao seu redor. Sempre era o mais novo que ganhava seu colo e seu carinho. Ela ficava passando a mão em sua cabeça, fazendo cafuné, até mesmo para que esse dormisse logo.



Seu repertório era variado: histórias de fadas, de princesas e até de terror. A que eu mais gostava era a "Bela e a Fera”, ouvia repetidas vezes e não me cansava, mas as favoritas de minha avó eram as de terror. 

Contarei uma delas:

Havia uma mulher que gostava de ir à missa todos os dias, só que tinha como hábito, chegar muito cedo. Certo dia, ela acordou assustada e correu se arrumar, achando que estava atrasada para ir à igreja. Chegando lá, a missa já tinha começado. Ao andar pelos bancos, passou pelo corredor procurando um lugar, um conhecido, mas reparou que não reconhecia ninguém e que todos estavam de cabeça baixa, também não se ouvia um ruído, tudo era um silêncio só…

O padre, vestindo uma batina escura e de capuz, ao ouvir os seus passos, virou de repente, como se alguém o interrompesse, olhou direto em seus olhos e… qual não foi o susto da coitada, o padre era uma caveira! A mulher ficou mais branca que uma vela, nem conseguiu gritar.  Ficou muda, só teve o impulso de sair correndo. Quando parou para tomar fôlego, olhou no relógio descobrindo que ainda eram quatro horas da manhã e… aquela missa, era a missa das almas!

Isso, para nós que éramos pequenas, era uma história de terror das mais assustadoras. Muitas vezes, minha mãe tinha que deixar uma luz acesa até que a última filha dormisse. Por falar nisso, nós dormíamos todas em um quarto só. Eram as mulheres em um quarto e os homens em outro, em todas as camas enfileiradas, uma do lado da outra. Ainda em amparo, morávamos em um casa de esquina, com cômodos grandes. Se não me engano, na Rua Luiz Leite.

Ela era minha avó materna. Era muito meiga e atenciosa, uma contadora de histórias de primeira.
Morava conosco também, a minha tia Lourdes, irmã de minha mãe. Lembro-me desse tempo com muito carinho e saudade.

segunda-feira, 15 de junho de 2015

Hildebrando Siqueira: o Poeta Futurista

Maria Zélia Siqueira* - setembro de 2009

Vou compartilhar com vocês, o lado “paizão” do poeta, sob o olhar apaixonado de uma garota de 11 anos. Lembranças de momentos mágicos vividos em comunhão com a família.


Hildebrando era um pai muito amoroso, nunca transferiu um problema para os filhos e, quando um deles chegava perto, conseguia sempre um carinho. Sua mania era ler um livro com o lápis atrás da orelha, para anotar alguma coisa ou grifar o parágrafo que o agradava. Mas, o mais interessante era ver o lápis que ele usava. Era muito bem apontado, a ponta era bem feita e fininha. Nunca consegui imitá-lo, por mais que me esforçasse!
Eu o admirava e ele sempre me fazia um elogio. Era calmo para falar, alegre e gostava de assobiar, batucando com os dedos, sentado em sua cadeira de balanço. Nossos olhos brilhavam de admiração!

Em Amparo, cidade onde nasci, morávamos em uma casa de esquina grande e gostosa. Papai, muitas vezes, brincava de trenzinho com os filhos, cantando uma música de Carnaval.
Em frente de casa, ficava um belo jardim e, ao lado, o ginásio do Estado, onde papai foi o primeiro professor de português. Nessa escola, meus irmãos mais velhos estudaram. Eu fiz a minha primeira série no colégio das freiras dominicanas, onde ele também lecionava.
Lembro-me das reuniões literárias, que ele fazia com os amigos, à noite, em seu escritório. Nessas noites, para não atrapalharmos, mamãe nos colocava mais cedo para dormir. Lembro também, de nossos passeios pelos caminhos das fazendas, ele achava um lugar debaixo de uma árvore para ler seu livro, enquanto ficávamos brincando. Recordo-me da inauguração do Parque na caixa d’água, que nós viemos rindo de minha irmã, Maria Therezinha, que em vez de dar a mão a ele, segurou na mão de um desconhecido.

Mudamos para Campinas em maio de 1944, e, para nós crianças, continuava tudo muito bom, pois estávamos com papai, mamãe e minha avó materna - vovó Ângela.
Eu estudava perto do colégio onde papai lecionava e, muitas vezes, voltávamos juntos para casa. Aqui em Campinas, ele lecionou em vários colégios, Ateneu Paulista, Coração de Jesus, Liceu entre outros.

Nós ficávamos orgulhosos quando íamos com ele na cidade e passávamos na praça, onde seus alunos se levantavam para cumprimentá-lo – em sinal de reconhecimento e admiração. Lembro-me também, em 1945, quando terminou a guerra, ele nos levou ao Largo do Rosário, para ver os pracinhas chegarem. Não pudemos ver muita coisa, a multidão era grande e eu me assustei, chorando para que fossemos embora!
Nós morávamos ao lado do Clube Fonte São Paulo e íamos a pé até a igreja do Coração de Jesus, no Botafogo. Papai gostava de assistir à missa para escutar o sermão do padre.
Ele nos levava também passear na estação Guanabara, para vermos os trens chegarem e partirem. No final, ele sempre gostava de beber um copo de garapa.
Enquanto eu me preparava para o exame de admissão do ginásio, papai me dava aulas de português e a vovó Zélia, aulas de matemática. Posteriormente, devo a ele muitos dos méritos conquistados em sala, como o dez que ganhei, analisando Camões.

Infelizmente, logo o perdemos, ficando um grande vazio em nossa casa. Sentíamos falta da sua risada, das músicas que cantarolava, dos seus batuques, enfim, da sua amizade. Enquanto viveu, ele foi um pai maravilhoso.
Sempre quis escrever sobre essa pessoa que eu tanto admirei em minha vida. Eu o amava e irei amá-lo enquanto eu existir. Todo dia 5 de novembro lembro de seu aniversário e, sinto uma vontade imensa de abraçá-lo e de beijar sua mão e pedir: a benção pai.

Certamente nos abençoa de onde está!

Sou a sétima filha de Hildebrando Seixas Siqueira e de Maura Toledo Siqueira; e a quarta das "Dez Marias”. Esse era o prenome de todas nós, escolhidos por minha mãe. O “Zélia” foi em homenagem à minha avó paterna – Zélia Seixas Siqueira.

** foto cadeira de balanço - greenstyle
Movimento da cadeira de balanço gera energia elétrica
para um avô futurista, uma cadeira de balanço futurista...

terça-feira, 29 de julho de 2014

Declaração de amor à minha Serra Negra


Mais uma vez venho recordar a minha saída de sua convivência.

Olhando na folhinha, vi que já se passaram cinquenta anos de nossa separação e, com muitas saudades recordo-me de você e das minhas andanças depois que te deixei. Muita coisa mudou na minha vida. Novos conhecimentos, novos horizontes, cidades mais cheias de novidades; colégios; teatros; novos divertimentos; gente nova para conhecer;  igrejas e ruas tumultuadas por gente desconhecida. Mas não me sai do pensamento aquela que jamais eu pensei em deixar um dia, em mudar-me de vez.

Um dia voltaremos. – dizia meu marido, que era professor e precisou trabalhar fora da nossa querida cidade serrana. Ele também ficou pertencendo à cidade, pelos anos ali vividos, pelo amor ao lugar e pela amizade pelas pessoas de lá. Trabalhou muito no jornal “O Serrano” como redator e colaborador. E, era muito estimado pelos diretores, os Lombardi e, mais tarde, o Sr. Romualdo Canhoni e seus filhos, de quem ficou muito amigo.

Nossos seis filhos nascidos nessa cidade, de amor e carinho pelos que se fazem estimar e trabalham para isso, sempre estão voltando a passeio e recordando o tempo que passaram na minha querida velhinha, hoje centenária. Um deles ficou ali  "plantado" junto a meu pai, Manoel Carlos de Toledo, o Nhozinho, como era conhecido, que também foi Serranegrense de alma e de coração.

Por isso tudo, minha querida velhinha, venho hoje e sempre virei, vez ou outra, recordar-me com saudades os dias vividos com você. Jamais sairá da minha lembrança o teu céu, sempre azul, as noites enluaradas, da serra gigante que ladeia o horizonte e das ruas. Da gente amiga e altaneira na tarefa de viver contribuindo para o seu crescimento e bem estar dos visitantes e amigos forasteiros.

Aqui fica, como sempre, a minha gratidão pelos benefícios alcançados, nos dias passados com você.

FIM

domingo, 27 de julho de 2014

Meus 15 anos! Que maravilha!!!

1920

Eu gostava de tudo e de todos. Meus pais, minha avó, minhas tias e tios, primos, amigos, minhas amigas, eram mais de uma dúzia e muito legais.  Naquele tempo não se falava gíria, quando muito uma ou duas palavras como baita (quando queria dizer grande) puxa vida (exclamação comum) tirar linha (flerte, namorico, passar tempo, rabicho) etc.

Eu, como minhas amigas, tinha muita amizade com os rapazes todos conhecidos das famílias amigas. Eu não namorava nenhum, pois gostava de trocar ideias e achava alguns de inteligência tacanha, eu não admitia gente sem cultura, moço que não soubesse trocar ideias, dialogar com assunto pelo menos agradáveis, sem troçar, sem brincadeiras sem graça, sem cultura alguma. Aqueles que não conheciam livros estrangeiros nem a nossa literatura, ou algum livro, jornais, revistas, nada, nada, nada. Havia famílias com filhos preparados para a vida, mas cultura mesmo era pouca.

Quando, aos quinze anos, conheci Hildebrando, foi um sucesso literário para mim. Ele conhecia tudo, poesias, livros de literatura, romances e tornou-se amigo do meu tio Genu, dos Campos Vergal e dos Oliveiras que eram também agradáveis e inteligentes, além de muitos outros, que se tornaram amigos.

Era uma roda agradável a nossa, a noite, no jardim. Minhas amigas não gostavam muito de parar para conversar, acontece que elas tinham namorado e eu ia segurar vela para elas, só que quem tinha fama de namoradeira era eu. A Maria Luiza namorava o Rodolfo, Constantino; a Durvalina com o Angelino. Chorava e gemia quando ele ia para o cinema pois tocava na orquestra. Naquele tempo era a orquestra que acompanhava os filmes, na overture (a abertura) antes da cortina subir para começar o filme. Mas dava gosto ver o Leão de Ouro e outras histórias, e também como charadas e perguntas. Era uma sessão para que todos participassem e colaborarem. Aos nove anos eu enviava para a revista Tico-Tico, diversos trabalhos escritos, versos e charadas. Eu lia muito nesse época e também gostava de escrever composições e redações.

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Orgulho em Pauta


Crônica publicada no jornal "O Serrano"– em 18.11.84

Tenho um orgulho que confesso: o de pertencer à família de jornalistas. O avô do meu saudoso esposo Hildebrando Siqueira, de nome Manoel Sartunino Seixas, era professor e jornalista em Pindamonhangaba e Campinas; Hildebrando também foi jornalista desde moço, em Campinas, no jornal “A Gazeta” e, mais tarde, em Serra Negra, minha querida velhinha e centenária, no jornal “O Serrano”. Desde quando o semanário pertencia aos irmãos Lombardi e, mais tarde, a Romualdo Cagnoni e ao Nenê, a quem o Hildebrando tinha muito carinho. Em Amparo novamente com os Lombardi, no jornal “O Comércio”, do qual Hildebrando foi redator e colaborador. Em Campinas, onde passou a morar, continuou escrevendo e foi redator do “Correio Popular e colaborador do “Defesa”. Hildebrando tinha verdadeira paixão pelo jornalismo, mais do que lecionar.

O nosso filho Francisco Isolino também é jornalista e, como o pai, gosta do cheiro das oficinas gráficas e da tinta dos jornais. Para ele, ser jornalista é uma religião. É um chamamento de sangue. Meu tio Ezeqias Marques gostava também de poesias, como sua filha Eronice que herdou do pai a sensibilidade poética.

Quando menina também visitei as oficinas do jornal “O Serrano”, no tempo dos irmãos Lombardi. Lá eu ia com meu saudoso pai levar material da Prefeitura para publicação.
Fiquei realizada e feliz quando vi, pela primeira vez, meu nome assinando um trabalho feito na escola, com Romeu de Campos Vergal, em 1915. Lá se vão sessenta e nove anos.
 “O Serrano”, ao qual quero abrir meu coração e minha saudade para felicitá-lo pelos seus bem vividos 77 anos de vida e circulação, faz-me agora muito grata ao ver acolhidas em suas colunas minhas poesia e escritos de minha terra e da minha gente.

terça-feira, 1 de julho de 2014

Jagunço


O professor Roberto ia viajar com a família e pediu-me para tomar conta do seu cão de estimação, um “Bulldog”, que o acompanhava há muitos anos. Iam demorar um mês, mais ou menos, durante as férias. Eu me encarreguei de tomar conta do animal e o Nelson, empregado do professor, levou o cachorro, chamado Jagunço, para minha casa, que ficava no fim da Rua José Bonifácio. O quintal era grande, um verdadeiro pomar e alí o cão podia correr à vontade.

Com as crianças, meus irmãos e primos ele se divertia a valer, correndo pelo quintal e acho que não estranhou e nem sentiu a falta dos donos. Comia e dormia perto do meu quarto, embaixo de uma mesa pois, de receio que escapasse e fugisse para a rua, não o deixava dormir fora no quintal.

Passado o tempo das férias, o Prof. Roberto voltou e mandou o Nelson buscar o cachorro, o Jagunço, que não quis acompanhar o menino, nem saiu do lugar onde estava . O Nelson prendeu na coleira de corrente uma cordinha para puxá-lo, mas o cachorro firmou corpo e não arredava as patas do lugar. Quando ví que o cão ia se machucar com o esforço do menino, me propus a levá-lo embora.

Chamei-o: “Jagunço, vamos passear, venha...”
Ele levantou-se de imediato e acompanhou-me sem mesmo precisar da corrente.
Chegando na casa do Prof. Roberto, ele e sua mulher Nina, vieram nos receber na porta. Eu não ia entrar, mas fui obrigada, pois o Jagunço não me deixava ir embora e quis mesmo me acompanhar de volta. Entrei, levei o cão para o quintal e a porta foi fechada. Eu nem me despedi do Jagunço, pois estive a ponto de chorar de pena dele.
Agradeceram a hospedagem que dediquei ao cão e fui para casa.

Lembrava-me todos os dias do Jagunço e, as crianças também sentiram falta.
Passados uns mês, mais ou menos, uma tarde apareceu o Nelson, pedindo para que eu fosse ver o Jagunço que não comia há dias e estava muito doente.

Chegando perto, levada pelo professor e sua mulher, vi um cachorro magro, feio, estirado num pano no rancho do quintal, era o Jagunço.
Quanto falei com ele, acariciei sua cabeça, ele quis se levantar, abriu os olhos, abanou a cauda e... morreu!

“Os cães também têm sentimento de amizade” – disse o professor, como os olhos cheios de lágrimas.

Eu nem me despedi, saí correndo...